Estrutura harmônica do cravo no Concerto Italiano-971 de Bach: visualizando a relação Física e Música, no ensino desta ciência

Pedro Javier Gómez Jaime, Global Education Magazine,Pedro Javier Gómez Jaime

Universidade Federal de Bahía, Facultade de Educação, Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento.

chototrova@yahoo.com  
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Resumo: O timbre é dos atributos do som o que maior complexidade apresenta e são os harmônicos componentes de um som os que caracterizam o seu timbre. No presente trabalho pesquisamos a contribuição harmônica de um fragmento do Concerto Italiano -971 de Bach, interpretado em cravo. Para estudar as contribuições harmônicas foi aplicada a Transformada Rápida de Fourier com o objetivo de transformar o sinal sonoro que estava inicialmente no domínio temporal num sinal no domínio da freqüência. As curvas de contribuição marcam destaque nas faixas 5, 10, 3, associadas aos intervalos de freqüência: (500-1k250Hz), (10-16kHz ) e (125-250Hz). Nesse sentido, acredita-se que o enfoque dado possibilite uma aproximação entre a ciência e arte (música), portanto, se nos apresenta como uma variante válida para o tratamento de conteúdos físicos em sala de aula no ensino de Física. Apontando fundamentalmente para uma formação integral, desde o ponto de vista do conhecimento e geral para cultura dos cidadãos.

 Palavras chaves: música, física, freqüência, harmônicos, timbre, contribuição harmônica.

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Introdução

A pesquisa ao redor da junção da Física e a Música constitui uma grande inquietude para mim desde a época de estudante universitário. Então, me perguntava como colocar em claro para leitores, estudantes e interessados em geral o elo entre estas duas disciplinas. Inicialmente pensava explicitar esta relação nas aulas de Física, tendo em vista o tema da Física acústica ou durante o tratamento do Movimento ondulatório mecânico. De tal forma que as pessoas percebessem esta ciência desde uma ótica diferente à que tradicionalmente é transmitida pelos professores de Física. Um exemplo do dito anteriormente o representa o desconhecimento ou surpresa que manifesta um considerável número de pessoas quando lhes falo sobre as minhas pretensões nesse assunto; assim mesmo o reconhecimento à importância que particularmente vejo nessa área da pesquisa científica.

A Física está presente em muitos dos eventos com os que interagimos diariamente e constitui objetivo do ensino de Física motivar à reflexão sobre a presença destes no cotidiano, tendo como luz guia a compreensão da natureza e dos fenômenos que nela se sucedem. Por sua vez, a Música é grosso modo a arte do bem combinar os sons no tempo. Poderíamos dizer que esta manifestação cultural possui a qualidade de movimentar o pensamento humano à reflexão, o movimento do corpo, a interpretação, os sentidos, a espiritualidade, o subjetivo e o objetivo, a escuta, a percepção. Penso que independentemente do gênero que se cultive, tem o poder de atingir a um grande número de pessoas, embora uma quantidade estimável destas mostre que este vínculo fica distante do domínio público.

Durante a minha pesquisa de mestrado intitulada “Física do som e sua relação com a Música. Um olhar nos livros didáticos” fiz um estudo sobre como os livros de Física do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio no Brasil (PNLEM, 2000) refletem e analisam esta relação nos temas dedicados ao Movimento oscilatório e ao Movimento ondulatório mecânico. Assim, foram analisados os seis livros que compõem esta seleção, mas o estudo foi iniciado com uma revisão do Livro de Física de Décimo grado do ensino médio cubano. A razão pela qual foi tomado este livro para iniciar a pesquisa é justamente porque as ideias e questionamentos primários, sobre o tema, me surgiram em Cuba. Devo reconhecer que então não tinha o conhecimento concreto do estado da arte, aos poucos fui me introduzindo no tema e assim mesmo sabendo de investigadores que como José Miguel Díaz (Espanha), Javier Luzuriaga e Raúl Pérez (Argentina) e os brasileiros João Zanetic e Carlos Eduardo Campos Granja, por citar alguns dos vários autores com que trabalhei durante a pesquisa. Todos de alguma forma vinculados à investigação relativa à Física e a Música. Vale a pena dizer que no caso de Zanetic o espectro é um pouco mais amplo quando se dedica também a relação desta ciência com outras manifestações artísticas. Da mesma forma, fui percebendo que este é um caminho pouco trilhado pelos investigadores e que conseqüentemente o nível de conhecimento da área é bastante limitado pela comunidade em geral. Posso parecer em ocasiões um tanto fechado nesta linha de investigação querido (a) leitor (a), mas acredito que se o vínculo das ciências como a Física fosse mais discutido pela população ou se potencializaram desde a escola, por exemplo, discussões dessa índole, a aversão que as pessoas têm pela Física seria minimizada e justamente essa diminuição levaria, a meu ver, a uma maior compreensão dos eventos naturais relativos a esta ciência. No que diz respeito a este artigo, tenho me proposto subir mais alguns degraus no estudo aos eventos sonoros, especificamente aqueles vinculados à sensibilidade musical.

Neste trabalho, terei presente argumentos adquiridos durante a pesquisa de mestrado e a partir deles pretende-se aprofundar nesta relação entre arte e ciência. Agora desde uma perspectiva mais abrangente que me ofereça à possibilidade de dar resposta aos questionamentos que ainda como pesquisador me faço sobre o tema. Outra razão que me mobiliza continuar a investigação neste tópico é a de socializar o saber que possa adquirir com este artigo. Embora não se coloque nas mãos dos leitores, ainda, como se dá a relação da Física com as emoções desencadeadas através da escuta musical, pois neste estudo só trataremos dos componentes harmônicos que formam um trecho do Concerto Italiano-971 de Bach executado em cravo. Isto visando um conteúdo que pode ser tratado em sala de aula com o intuito de colocar ao alcance dos estudantes a relação da Física com a Música. Ao final os PCNs propõem que a Física seja tratada não como um elemento único e sem nexo, mas relativa a outras áreas do saber as quais podem estar tão próximas no nosso cotidiano.

A abordagem ao redor da Música e seu elo com a Física, penso, permitirão perceber esta última desde uma dimensão cultural e aproveito para especificar aqui cultura como conhecimento, instrução, como os saberes adquiridos pelos homens na sua interação com o mundo. Interações nas quais, este, tem estabelecido relações sociais e com o meio em questão e nas quais também a Música tem tido uma participação significativa que lhe tem possibilitado ao ser humano construir o saber que deu e dá passo ao saber científico como o conhecemos. Este trabalho pretende dar às pessoas ferramentas que lhes possibilitem visualizar o mundo mais profundamente, assim como também mudar a sua interpretação sobre este. É o intento de quebrar a dicotomia existente entre ciência e arte, de forma que se contribua à diminuição do caráter hegemônico da primeira ainda no século XXI.  No que a minha pessoa se refere, percebo nisto uma discussão enriquecedora, inteligente, motivadora, propiciadora de elementos que levaram de alguma forma a que os seres humanos se replantem a interpretação que dão aos sons com que convivem.  De maneira que a audição e a escuta, a sensibilidade e o sentimento como formas de perceber e manifestar o mundo, sejam também vistas não apenas como capacidades que temos os humanos, mas qualidades estreitamente vinculadas à ciência, a arte musical.

Fundamentação Teórica

1.1 Uma discussão sobre a percepção

  A Física é uma ciência que está presente em muitos dos eventos naturais, porém sua visualização pela comunidade ampliada e questionável. Pouco tempo após começar me interessar por este ramo da pesquisa científica, estimei possível que a dificuldade do reconhecimento da Física como parte do nosso dia-a-dia poderia ter suas bases no próprio ensino de Física. Aos poucos e com atenção, pensei se a raiz do problema pode-se estar na escola, idéia que foi sendo mais concreta e ganhando significados.

A percepção ocupa um espaço fundamental no que se refere à dimensão cognitiva humana. É através dela que o homem, conhece o mundo em que vive, com o qual interage observando os seus eventos naturais e objetos. Tais manifestações ganham diferentes significados para uns e outros em dependência do contexto de atuação, por exemplo, a história de vida, o desenvolvimento de habilidades ou não nos indivíduos na sua constante interação com o meio. De tal forma que a percepção não está desvinculada de um contexto de significado.

Geralmente quando se fala de percepção, intuitivamente pensamos nos órgãos dos sentidos, especificamente, na visão, a audição e o tato. Segundo Santaella (1993-2001) olho e ouvido são órgãos dos sentidos mais ligados ao cérebro com um grau de complexidades superior aos demais como o tato, o paladar e o olfato. Uma mostra disto refere-se a que a atualidade o homem tem construído um certo número de instrumentos para ampliar a sua capacidade visual e auditiva, exemplo disto o constituem: microscópios, telescópios, microfones, alto-falantes entre outros aparelhos. Estes últimos muito utilizados na música e na emissão de som. Nesta manifestação artística, a percepção ocupa um lugar central, seja na perspectiva de ouvinte (receptor) ou na de emissor, neste caso específico de músico (interprete ou compositor). Para Campos Granja, 2008 o nível de conhecimento musical de uma pessoa está estreitamente vinculado ao grau de refinamento que se tenha da percepção. Músicos com certa experiência são capazes de distinguir harmônicos de um som e reconhecer notas de um acorde. Estas sutilezas auditivas passam comumente por alto aos ouvidos de pessoas que não estejam relacionadas à Música ou que não tiveram o mesmo desenvolvimento perceptivo. No caso da Música a Teoria Semiótica mostra que a percepção é o meio mais eficaz de aproximar (Campos Granja, 2008) o sensitivo do cognitivo.

A semiótica estuda os diferentes tipos de linguagens, entende-se linguagem, qualquer tipo de sistemas de signos que produza algum sentido para o ser humano. Portanto, a semiótica não se restringe às linguagens verbais ou simbólicas, englobando uma ampla gama de linguagens. No que diz respeito à Música, é uma linguagem com signos próprios, cujo entendimento não passa necessariamente pelo crivo verbal. A teoria semiótica de Pierce discute três categorias que são a essência de qualquer experiência, evento ou pensamento: a qualidade ou primeiridade, a relação ou secundidade, e a mediação ou terceiridade. Para Pierce (2003), um objeto representa um objeto qualquer para a mente, provocando o surgimento de um novo signo. Esse novo signo surge na forma de uma nova percepção. O signo corresponde justamente à noção de terceiridade, ao ponto que coloca um primeiro em relação a um segundo, funcionando como mediação. O objeto que o signo representa pode ser um objeto tangível e pode ser também algo intangível ou imaginável. Nesse sentido pode-se nomear, sonhos, pensamentos, ideias, uma abstração, etc.Resulta importante ressaltar aqui que nenhuma percepção, pensamento ou linguagem se constitui pela mediação de um único signo. Sendo assim Pierce (2003) distingue três tipos de signos que se relacionam em qualquer tipo de processo perceptivo. Estamos falando do que Pierce deu em chamar signos fundamentais, os quais estão baseados nas categorias antes mencionadas: o ícone, o índice e o símbolo.

Ícone: é o signo que medeia o objeto recorrendo a uma qualidade comum, sendo assim relativo à primeiridade. É um signo altamente sugestivo, podendo produzir na mente humana as mais variadas associações. Por exemplo: uma clave de Sol dá a idéia de Música para aquele que veja ela numa propaganda, por exemplo. Assim mesmo ocorre com uma notas musicais que se desenhem em comemoração de uma festa popular.

Índice: O índice funciona como referencialidade e aponta para algo com o qual guarda relação. Pressupõe um vínculo com o objeto, próprio da secundidade. Tem-se como exemplo deste signo poderia ser o cabelo cinza de um regente musical, pode indicar a experiência desta pessoa ou o domínio na atividade que realiza.

Símbolo: Este signo atua como mediação de seu objeto por meio de uma convenção ou representação. É o signo no seu caráter mais elaborado, ligado à categoria de terceiridade explicada acima. Um exemplo seria neste caso mencionar a palavra piano, representando um objeto do tipo piano na mente das pessoas.

Vale ressaltar aqui que não existe percepção, linguagem ou pensamento vinculado a um único signo, mas por uma combinação dos três em qualquer seja o processo perceptivo. Embora exista um predomínio de um signo por sobre os outros dois em uma percepção determinada. Na linguagem musical o icônico por exemplo.

1.2 Escuta e audição

Na fala comum dos seres humanos as palavras: escuta e audição acostumam levar o mesmo significado, associado, como é lógico a atividade própria da audição. Embora, segundo Campos Granja, 2008, não há um consenso quanto à distinção entre estas palavras, achamos pertinente destacar que a palavra escuta constitui um processo mais elaborado que o ouvir. Nesse sentido, ouvir seria captar fisicamente a presença do som no ambiente em que se esteja. Nesta perspectiva o ouvir estaria mais perto da dimensão sensorial da percepção, que corresponde à categoria perciana de primeiridade. Por sua vez, a escuta estaria mais próxima da categoria interpretativa da percepção, que corresponde à categoria da terceiridade. A escuta é o sentido da convivência e da significação. Ela nos permite ter acesso à palavra falada, e com isso ao mundo dos outros seres humanos e assim mesmo ao conhecimento. A escuta é uma instância fundamental tanto de decodificar sinais sonoros extremamente complexos, dando a eles um significado que nenhuma outra espécie é capaz de dar, é assim que ouvimos sons melódicos e harmônicos, dissonâncias, consonâncias, timbres e mudanças na intensidade sonora de uma música.

Escutar musicalmente é mais que uma simples percepção das vibrações sonoras. Escutar musicalmente é estabelecer múltiplas relações entre as ondas sonoras que atingem nosso ouvido. Este processo da escuta musical é conduzido por um processo de antecipação, ou seja, antecipamos aquilo que já conhecemos. A compreensão de uma música ocorre quando reconhecemos relações sonoras que existem em nossa memória. Ainda que a música seja totalmente nova para os nossos ouvidos, nós seres humanos podemos reconhecer elementos sonoros já conhecidos. É assim que por meio de uma escuta atenta o ouvinte pode ampliar o seu espectro de “relações sonoras” conhecidas. Quanto maior for esse espectro, melhor será a sua compreensão musical. Embora varie de pessoa para pessoa, a habilidade para a escuta musical pode ser desenvolvida. Daqui que músicos e pessoas vinculadas à atividade musical possuam em um alto nível esta habilidade. E de essa mesma forma uma grande sensibilidade musical.

1.3 Oferta e escuta musical hoje

Hoje a oferta musical existente é demais, desde o acesso até a quantidade de grupos, bandas que desenvolvem um tipo ou outro de gênero musical. Antigamente isso não acontecia dessa forma, pois o único meio de divulgação musical que existia era a partitura. Antes da revolução tecnológica que possibilitou ao homem o registro e a reprodução sonora a larga escala, havia poucas formas de se ter acesso à música.

Na atualidade uma enorme oferta de CDs, rádios, ipods entre outros equipamentos eletrônicos dão ao ser humano a possibilidade de acesso imediato a todo tipo de música. Esta manifestação cultural se faz presente desde a capital até o sertão, e a curtem todas as classes sociais. Se escuta música nos locais comerciais, nos trabalhos, igrejas, espaços públicos e privados, nos veículos de transportação, e está presente também em outras manifestações da cultural de um povo como no cinema, no teatro, na dança, as artes plásticas. Na sociedade atual a Música é usada para as mais diversas finalidades. Utiliza-se a Música para influenciar o comportamento ou a atitude do consumidor nas compras de um mercado, a paciência das pessoas, e inclusive a velocidade que devem ter os trabalhadores. Porém a conseqüente transformação da Música num bem de consumo e o seu uso constante têm relegado a escuta musical atenta para outros planos distantes do primeiro. Hoje a música, por exemplo, que se faz para o carnaval da Bahia por muitas bandas não está feita para ser ouvida ou levar ao receptor a uma interpretação consciente das frases musicais. O grau de atenção da nossa escuta, assim como da sensibilidade musical varia de acordo com o significado que determinada música tem para nós. Nossa atenção é maior quando ouvimos uma música da nossa preferência do que quando ouvimos uma música ambiente ou comercial.

Ao nos acostumarmos com essa escuta passiva, estamos perdendo uma dimensão importante do conhecimento musical, que é a criação de significados e assim nos convertemos em plenos repetidores do que dizem algumas letras vazias que acostumam a soar por aí. Assim é que estreitamos nossas perspectivas musicais ao deixarmos de enfrentar a novos desafios perceptivos. De acordo com Campos Granja, 2008.

Por meio de uma escuta musical ativa podemos diferenciar uma música ambiente de uma sonata de Mozart, compreendendo o que há de profundo, no que diz respeito à história e a cultura da humanidade.

 A Música é uma linguagem que chega a nosso corpo diretamente antes de nos levar a qualquer tipo de reflexão e, por isso, costumamos nos entregar a ela passivamente. Por outro lado, e este mais ligado com o interesse de nosso trabalho, a Música também tem a capacidade de provocar nossos pensamentos e sentimentos, levando o ouvinte a apreciar sua beleza estética e a compreender seu significado.

1.4 A Física e a Música. Elementos históricos desta junção

Estarão acaso relacionadas estas duas disciplinas? Para alguns pesquisadores da área com os que concordo, sim estão relacionadas. O que é Música? É de maneira mais simples, a seqüência de sons rítmicos que soam de forma agradável ao ouvido humano.

O que é a Física? Na forma mais simples, a ciência que estuda a natureza e assim mesmo encontra as leis que a regem.

Será o cantar dos pássaros música? Sim e não; sim porque corresponde à definição: Seqüência de sons agradáveis ao ouvido humano e não, porque com certeza para os pássaros, as notas que eles mesmos produzem são uma forma de linguagem para a comunicação entre eles e não uma seqüência propriamente musical, no que diz respeito aos seus ouvidos.  Neste sentido, temos certas emissões sonoras de determinados animais não poderiam ser consideradas como agradáveis.

O ser humano, ao longo dos séculos, tem-se transformado num ser cada vez mais exigente conforme amadurece a sua inteligência e sua sensibilidade; com isto, as seqüências de notas tem-se ajustado às leis da Física, ainda o próprio homem não o reconheça. É assim que começa trabalhar na combinação de sons e descobre dessa forma as dissonâncias, isto é, o efeito desagradável que certas combinações de notas produzem (Díaz, 1998) quando se tocam ao uníssono e descobre a beleza de outras combinações de notas que certamente guardam entre si uma relação matemática. Neste aspecto, foram os gregos especialmente os pitagóricos quem começaram fazer física musical, ao estudar os comprimentos das cordas musicais e com isto, as relações numéricas que fazem agradável o som ao ouvido humano.

Posteriormente dedicaram-se a confrontar o que eles chamaram de escalas musicais, escalas baseadas em seqüências deduzidas das relaciones numéricas entre as notas. Aqui devemos dizer que uma nota musical se propaga no ar em forma de uma onda longitudinal sonora e que suas características físicas são: Altura ou freqüência, Intensidade ou volume e o Timbre ou forma da onda. A altura de uma nota representa quão aguda ou grave é esta. Uma nota aguda é a que dá uma soprano em seu registro de voz e uma nota grave é a que pode dar um baixo; as notas intermédias correspondem aos registros das metzosopranos, das contraltos, dos tenores e dos barítonos. A intensidade é, o forte ou fraca que pode ser a nota; a intensidade corresponde fisicamente à amplitude de oscilação da onda sonora. O Timbre o Forma de Onda, nos permite distinguir, dentre duas ou mais notas da mesma altura ou freqüência e intensidade ou volume, nos possibilita distinguir, o instrumento ou a voz que as produzem; se escutamos ao mesmo tempo uma nota de violino e a mesma nota dada no violão, o timbre é o que nos permite diferenciá-las.

O ser humano é segundo Díaz (1998) uma modalidade artística, começa a inventar seqüências de notas que são agradáveis e as chama de melodias além disso descobre que se pode continuar inventando outras melodias. Descobre assim mesmo que ao canto de uma melodia lhe pode adicionar outra voz cantante que, em outro tom que siga harmonicamente à primeira voz e a segunda, segue estritamente as leis que os pitagóricos encontraram faz mais de 2000 anos e que quem se separa dessas leis, simplesmente gera outros tipos exóticos de música.

No caso dos instrumentos musicais; estes são, criações artificiais capazes de produzir seqüências de notas que previamente se tem calibrado de acordo às escalas musicais. Neste ponto é importante mencionar que há um convenio mundial para que todos os instrumentos obedeçam a uma escala musical cuja nota de referência seja o LA central do piano, com freqüência de 440 Hz, embora esta nota não esteja exatamente no centro do teclado, falando em termos físicos. E falando de teclados, deve-se mencionar que a escala musical desenvolvida pelos gregos sofreu no passado uma modificação importante, onde a explicação foi matemática, embora a sua aplicação fosse eminentemente experimental.

Por sua vez a escala temperada surge e se estabelece devido a que com a escala baseada no trabalho dos pitagóricos, os teclados não permitiam tocar uma obra musical em qualquer tom. A solução a este assunto foi uma proposição de um compositor, musicólogo y matemático espanhol chamado Bartolomé Ramos de Pareja; ele resolveu o problema matemáticamente, ainda que não tenha chegado a sua aplicação, mas há que ver que isto ocorreu no Século XV, justo na época do descobrimento de América por Cristóbal Colombo. Foi Johan Sebastian Bach, quem aplicou o conceito de temperado, encontrado por Ramos Pareja e afinou seus órgãos sob esse princípio, cujo resultado foi poder tocar qualquer peça em qualquer dos 12 tons da escala. A fórmula matemática de Ramos de Pareja nos diz que, para subir de um tom qualquer ao meio tom imediato superior, há que multiplicar a freqüência do tom pela raiz doseava de 2, aproximadamente 1.05946. Assim para obter o LA sustenido a partir do LA de 440 Hertz, há que multiplicar 440 por 1.05946 que nos dá 466, que é o LA sustenido, e assim sucessivamente até completar todas as notas da escala.

Falando de timbre e de Bach este estudo se centra metodologicamente no estudo dos componentes harmônicos de um trecho do Concerto Italiano-971 de Johan Sebastian Bach com o intuito de que estes conhecimentos sejam visto não como algo isolado, mas integrador de forma que tribute ao ensino de Física de alguma maneira.

 2. Metodologia

Uma vez definida a música alvo do nosso estudo: o Concerto Italiano-971 de Johann Sebastian Bach (1685-1750) foi feito um reconhecimento daquele fragmento que subjetivamente identifiquei como um ponto destaque da intencionalidade do autor. A escolha de Bach não é neste estudo um acontecimento banal ou que desmereça a obra de autores latino-americanos (em geral), e de forma particular de cubanos ou brasileiros; assim também como de outros compositores europeus, chineses, norte-americanos, indianos, africanos, australianos.  Acho interessante, neste sentido, fazer as seguintes colocações, as quais de nenhuma maneira deixam entrever a minha devoção pela obra do músico, mas o meu reconhecimento e respeito pela obra de toda uma vida. Levando em consideração tais pressupostos, acho pertinente mencionar que a obra de Bach faz parte da maioria dos programas de concerto de formatura de estudantes de instrumento de todo o mundo, o que de alguma maneira o converte em uma referência de compositor a nível internacional. Sendo assim, este trabalho não pretende atingir unicamente leitores americanos, tanto do norte quanto do sul, mas abranger outros espaços e culturas no planeta, propiciando a possibilidade de intercâmbio ao redor do saber que envolve a influência do timbre como atributo do som nas emoções musicais. E por sua vez, colocar ao alcance das pessoas interessadas o conhecimento que modestamente sejamos capazes de difundir com este estudo.

Outras razões que me fazem afiliar a obra de Bach, em particular, ao seu Concerto Italiano-971, é que as peças de Bach estão em domínio público e as partituras estão disponíveis gratuitamente tanto em partituras em papel, digitais quanto em gravações no YouTube. Por outra parte os trabalhos de recuperação da obra de Bach são extremamente maduros. Segundo Sampaio (2008), Grout e Palisca (1994) as obras já foram levantadas, classificadas e catalogadas. Dessa forma é possível seguir para outros temas que não para a edição musical. O que de alguma forma oferece fidelidade à peça escolhida, pois esta(s) existe(m) em outros formatos além da possível escuta auditiva, possibilitando assim, colocar a(s) mesma(s) ao alcance de pessoas que se identifiquem com a obra do compositor. Vale à pena chamar a atenção também que segundo estes autores Bach compôs para inúmeras formações musicais, exemplo disto o constitui a nossa eleição; a mesma música executada por três instrumentos diferentes: cravo, piano e violino, o que oferece diversidade de timbres.

Dessa forma, tanto quanto, assinalo argumentos que impulsionam a afiliação do nosso trabalho a esta obra de Bach, poderia dizer por que não elegemos um (a) compositor (a) mais próximo de nós. Podemos citar, por exemplo, Villa-Lobos. A obra de Villa-Lobos foi editada pela francesa Max Eschig, é cara e precisa ser importada. A dificuldade de acesso às partituras dificulta o estudo de tais obras, assim como as de outros compositores brasileiros, embora seja reconhecido o potencial que em matéria de música possui este país. Portanto, a solução dos problemas musicológicos das obras de compositores brasileiros, segundo Sampaio (2008) ainda está no seu início. Para este mesmo autor, as gravações de obras de compositores brasileiros muitas vezes têm baixa qualidade e/ou estão inacessíveis. Possivelmente seria necessário entrar em contato com a família dos compositores para conseguir material e informações. Portanto, como este trabalho não é um estudo de musicologia, e é passível de fazer com qualquer compositor que tenha alguma diversidade na formação instrumental de sua obra, acredito que não faz sentido ter que resolver tais problemas musicológicos apenas para satisfazer os meus próprios desejos nacionalistas como cubano ou talvez daqueles existentes em alguns pensadores brasileiros. Dessa forma, priorizo o conhecimento que envolve este estudo ao redor do timbre e as emoções musicais.

Os fragmentos analisados do Concerto Italiano- 971 de Bach foram identificados levando em consideração o instrumento de execução; dessa forma foi denominado: Teste1 (ConI)-cravo. Com duração de 33 segundos , o que de certa forma ajudou na segunda fragmentação, pois ainda que o tempo possa parecer pequeno, no que diz respeito a qualquer música que poderíamos ouvir no cotidiano, neste caso o número de dados é significativo para levar a cabo nosso estudo sobre os componentes harmônicos, inicialmente, associados a cada teste. De tal forma, estes (os testes) foram divididos em outros três fragmentos os quais denominei de: Frag1_1, Frag1_2, Frag1_3 para este instrumento. É desta segmentação que surgem os 96 trechos (fragmentos) aos quais lhes foi aplicada a Transformada de Fourier Rápida (FFT); correspondentes ao cravo. Este processo de fragmentação da música possibilitou a aplicação da análise harmônica a partir da Transformada de Fourier Rápida (FFT – Fast Fourier Transform) com o intuito de identificar os harmônicos associados a pontos específicos (discretos) de cada um dos fragmentos em estudo e a correspondência de cada um deles (os pontos relativos aos harmônicos) com valores de freqüência e amplitude. Além disso, a realização desta última segmentação leva implícita a consideração daqueles trechos periódicos, ou seja, daqueles que se repetem, embora estes só estejam presentes em um teste específico, mas devido à primeira segmentação poderíamos encontrar no Frag1_1 um fragmento que também aparecesse no Frag1_2 ou no Frag1_3 para o mesmo instrumento, portanto um mesmo trecho periódico, sob este princípio, não foi analisado duas vezes em nenhum caso. Ver figura 1 a seguir.

Figura 1. Exemplo de fragmento período na segunda segmentação, global education magazine

Figura 1. Exemplo de fragmento período na segunda segmentação

A Transformada Rápida de Fourier permite colocar um sinal que está no domínio do tempo no domínio da freqüência; a utilização desta no nosso estudo encontra subsídio, pois a nossa sensibilidade auditiva tem uma relação explícita com a freqüência e implícita com o tempo, no momento em que o sinal acústico de um tom chega ao nosso ouvido. Tais oscilações da membrana basilar, Roederer (2009) estimulam as células pilosas que estão na zona de ressonância que corresponde a essa freqüência estimulando dessa forma a atividade neural. A transformada foi aplicada aos diferentes fragmentos, e uma vez realizada esta e a plotagem dos pontos a partir da transformada de Fourier foram obtidos espectros acústicos para o cravo. Ver figura 2.

Estrutura harmônica do cravo no Concerto Italiano-971 de Bach, global education magazine

Foi a partir desta que fixamos de valores de freqüência (faixas de freqüência) sobre as quais foram determinadas as contribuições harmônicas de cada segmento (fragmento) musical: 32, 64, 125, 250, 500, 1k250, 2k500, 5k, 7k500, 10k, 16kHz.  Uma vez determinadas as contribuições para cada intervalo de freqüência em cada um dos fragmentos, estas foram somadas e divididas pela largura que separa cada um dos intervalos de freqüência acima, ou seja, para 32, 61, 125, 250, 750, 1250, 2500, 2500, 2500, 6000. Dessa forma, tendo o que chamei de “Soma dos Componentes Parciais (SCP)” para cada um dos segmentos (fragmentos) Frag1_1, Frag1_2 e Frag1_3 desta execução e finalmente somando estes neste instrumento foi que obtivemos a curva das contribuições harmônicas para o cravo. De tal forma que com elas podemos identificar em que faixa (intervalo) de freqüência se encontra o de maior destaque harmônico.

Estrutura harmônica do cravo no Concerto Italiano-971, global education magazine

Considerações finais

O timbre é dos atributos do som o que maior complexidade apresenta e são os harmônicos componentes de um som os que caracterizam este atributo. No presente trabalho pesquisamos a contribuição harmônica de um fragmento do “Concerto Italiano de Bach” interpretado em cravo.

O estudo deste elemento do som possibilitará uma visão mais abrangente da física envolvida na música, contribuindo para uma mudança de visão de mundo referida a esta ciência e a esta manifestação cultural.

Como se pode ver no último gráfico os três harmônicos de maior destaque se referem às freqüências 5, 10, 3, intervalos: (500-1k250Hz), (10-16kHz) e de (125-250Hz) respectivamente associados a valores de amplitude. Neste sentido, se poderia explicar a presença destas freqüências e o que elas significam na identificação de um som. Qual é o sentido do timbre como atributo sonoro e como no cotidiano lidamos com essa questão. Tais freqüências constituem componentes do som estudado e caracterizam o instrumento em questão, embora variações em outros parâmetros poderiam influenciar o seu timbre.

Concebendo as faixas de freqüência sob as quais foram feitas as medidas poderá se enfocar no ensino de Física a faixa de freqüências audíveis para o seu humano, que embora seja tratado em sala de aulas, de maneira geral passa inadvertido para os estudantes. Assim como o uso da transformada de Fourier possibilita que o estudante perceba que esta permite a passagem de uma função que descreve um pulso que está no domínio do tempo para uma função que está no domínio da freqüência; deixando portanto, perceber que somos explicitamente sensíveis à freqüência e implicitamente do tempo. Este trabalho permite a quebra de concepções alternativas ao redor da relação entre ciência e arte que tanto se persegue e que aparece plasmado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs 2000).

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This article was published on 10th December: Human Rights Day, in Global Education Magazine.

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